terça-feira, 20 de outubro de 2009

Harmonia

Cumpriu sua pena.
Depois de longo tempo em reclusão finalmente foi posto em liberdade. Depois de longo tempo, reforçado pelas duras horas pelas quais passou, cumprindo trabalhos forçados e sendo torturado física e psicologicamente, mal podia acreditar havia chegado a hora de dizer adeus àqueles dias.

Não sabia bem o que fazer, como agir, onde ir. Então achou que era melhor deixar-se levar pelo seu instinto nessas primeiras horas, nesses primeiros dias de vida. Após completar o procedimento de saída, viu-se tão ávido a sair logo daquele lugar que nem se deu conta de que já estava caminhando livre.

Após cruzar a velha estrada, sentiu o sol dar-lhe um tapinha nas costas. Há quanto tempo não sentia o solzinho esquentar-lhe os ombros! Aí sim, deu-se conta, de que já estava fora, de que já havia cumprido sua parte, de que não devia mais nada a ninguém - apenas a si mesmo, e isso ele carregaria pelo restante de sua vida, recluso ou não. Neste momento, ouviu também a festa que os passarinhos faziam, ouviu o vento balançar as folhas das árvores e levantar graciosamente a poeira do chão. Sentiu-se vivo.

Sentiu-se vivo e deu-se conta de que estava com sede e seguiu em direção ao riacho. Caminhou um pouco, mas o sol os passarinhos ainda lhe acompanhavam, e ele estava feliz. Ao chegar na margem, agachou-se e fechou as mãos numa tentativa de formar um copo onde pudesse colher um pouco de água para beber. Repetiu o ato várias vezes e, então, decidiu-se livrar daquele cheiro, daquele asco que aquele lugar tinha. Como o lugar era deserto, tirou as roupas, dobrando-as cuidadosamente e colocando-as onde estava sentado, entrou na água e sentiu-a, na temperatura mais perfeita, envolvendo seu corpo.

Demorou-se naquele momento tão renovador e, quando finalmente saiu, sentou-se na borda do riacho, observando a natureza em volta e tudo que havia perdido naquele longo tempo em que perdera contato com o mundo. Sentiu-se tão a vontade que parecia que simplesmente estivera naquele mesmo lugar sua vida toda.

Agora, a vida estava apenas (re)começando.

Um comentário:

Mr. Blank disse...

Muito massa, Pezinho!