terça-feira, 4 de novembro de 2008

Caverna e Realidade

Revolucionário.

É como eu resumiria o livro A Caverna, de Saramago, em uma palavra - se é que não estou sendo maldosa em reduzir um tijolão de 350 páginas em apenas catorze letras.

Mas esse é o sentimento que foi crescendo a medida que as páginas iam sendo viradas. Com ele, uma onda enorme abraça o leitor e abre seus olhos para uma auto análise e uma análise do que há em volta. Como todo livro de Saramago.

A realidade é dura demais e vai incomodando o ser humano.
Antigamente ninguém se preocupava em trancar as portas de casa como se faz hoje em dia. A necessidade inventou o portão eletrônico, a cerca elétrica, as câmeras de segurança, a segurança 24 horas. Antigamente, não era preciso nem cercar a casa com portões. Hoje em dia, todas as medidas de segurança são poucas e o indivíduo vai morar num condomínio fechado. Mas ainda não basta: ele tem que sair do seu casulo para levar as crianças na escola, fazer compras, ir ao cinema ou jantar num restaurante bacana. E ele é abordado no semáforo, na calçada, no portão de casa. E todos aquele aparatos se mostram inúteis.

E qual é o próximo passo? Um lugar que ofereça tudo isso! Claro! Como ninguém havia pensado nisso antes! Um lugar livre de roubos, de desconhecidos suspeitos, de maldade. Um lugar em que possamos oferecer tudo que uma pessoa precisa: casa, diversão, educação, saúde!

E o indivíduo paga pela sua paz de espírito. Por que a realidade lhe dói e ele não quer fazer parte das estatísticas. Ele paga e vai morar num lugar desses. Onde não precisa sair. Onde não vê o mundo, não pisa na grama, não ouve os pássaros, onde o único vento que ele sente mexer os cabelos é o do ar condicionado, apontado para si numa tentativa de não passar calor. O mundo está desmoronando, os problemas sociais aumentando e ninguém quer saber de fazer nada. A única atitude que tomam é livrar o seu traseiro dessa insanidade. E os problemas só se agravam. Mas quem se importa?

E o indivíduo vive feliz. Controlado. A mente fechada na realidade que lhe oferecerem, como se essa fosse a verdadeira.
Assim como no mito da caverna de Platão, segundo o qual algumas pessoas viviam acorrentadas no fundo de uma caverna, e dispunham de apenas um feixe de luz que projetava na parede as sombras do que acontecia no mundo exterior. Para as pessoas que estavam na caverna, aquela era a realidade lá fora. Uma delas, no entanto, conseguiu quebrar as grilhões e sair, descobrindo que aquelas sombras eram feitas por outros homens, além de conhecer todo o mundo que havia lá fora. Essa pessoa decidiu voltar à caverna, pra dividir o que viu, mas não foi bem recebida pelos que ficaram lá dentro.

O triste é que nós não queremos sair da caverna, mas entrar nela.